Ao ler, ontem, no blog da livraria Pó dos Livros, um post sobre livros antigos , lembrei-me de imediato de uma curiosa história que vivi há cerca de três anos, precisamente depois da compra de um livro antigo.
O livro, que comprei num alfarrabista que ocasionalmente deslocava parte dos seus livros à FCSH-UNL, era De la tradition théâtrale, de Jean Vilar (edição francesa da Gallimard, de 1955). Trouxe-o para casa e, quando o abri numa página ao acaso, encontrei algo que não tinha visto quando o comprei. Bem preso entre duas páginas estava um Boletim de Casamento, datado de 1966, da Conservatória do Registo Civil de Coimbra. Mais, o noivo era um conhecido político português, recentemente – à data – falecido. Resolvi, então, tentar contactar a noiva identificada no boletim, com o intuito de lho entregar, pensando que este seria um documento com valor pessoal, e que pudesse ser uma boa memória, ou pelo menos um documento que deveria constar dos documentos da respectiva família.
Encontrado o contacto da senhora e confirmando-se o seu nome completo, liguei-lhe, então, certa tarde. Foi a própria que me atendeu. Contei como tinha ficado na posse de um documento certamente tão importante para ela, e prontamente recebi resposta. Uma resposta confusa, mas uma resposta, ainda assim. Insistiu que não fazia ideia nenhum do que estava eu a falar. Afirmou mesmo que nunca fora casada com ninguém, ainda que aquele fosse o seu nome os todos os outros dados fizessem sentido. Baralhado, pedi desculpa pelo incómodo e desliguei. Até hoje, por vezes ainda penso no que terá acontecido, certo de ter falado com a noiva constante deste Boletim de Casamento que ainda hoje conservo no livro onde o encontrei.
Como Jaime Bulhosa escreveu no post que referi da Pó dos Livros, «o livro usado está cheio de mistérios», e encerra em si muito mais histórias do que aquela que lhe dá o título.
Hugo Picado de Almeida