Há quem critique as bandeiras francesas nas redes sociais, dizendo que, então, deveríamos igualmente usar a libanesa, a palestiniana, entre outras. Peço desculpa, mas não.
Importa que, em momentos como este, não cometamos o erro de querer ser mais solidários do que os outros, acabando por não ser nada que valha a pena designar. Acaso não colocariam todos bandeiras portuguesas no perfil se os atentados se dessem em Lisboa? Pessoalmente, Paris é-me mais próxima do que Beirute, e França mais cultural e emocionalmente familiar do que a Palestina. Mais do que isso: depois de Lisboa, Paris é a cidade com mais portugueses no Mundo. Mais do que o Porto, mais do que qualquer outra cidade em Portugal. Todas as vítimas são obviamente a lamentar e a respeitar, mas nos limites das possibilidades individuais, honramos as que mais próximas nos são. Na verdade, elas tornam-se símbolo que todas integra, e não excluem as demais — curiosa inversão: os que propalam as honras totais acabam por ser publicitários da divisão; os que se revelam contra as bandeiras são os que mais ferozmente as tomam pelo seu lado divisor.
Por tudo isto, e se lamento as vítimas dos extremismos em qualquer parte do Mundo, peço desculpa também, mas Paris e a França são para mim, para a minha cultura e para a minha história pessoal, mais do que sou do que Beirute. Pela mesma razão, as famílias enlutadas no Líbano reclamam para si a sua bandeira no Facebook: para elas, mais importantes são os seus filhos mortos do que os que perderam a vida nas ruas da Europa. E isso é apenas natural e compreensível.
Em momentos como este, é preciso ter cuidado e não apontar como hipocrisia a identificação maior que os outros sentem. Afinal, estamos todos a defender o mesmo, em luto pelas mesmas razões, e mais vale fazer um pouco do que acabar a não fazer nada. Cada um fará o seu luto à sua maneira, mas não devemos esquecer o que em jogo está aqui. As vítimas de um dos maiores atentados de que há memória na Europa merecem um pouco mais.
Hugo Picado de Almeida